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Gaúchos que acreditaram prosperar com o eucalipto embarcaram num vertiginoso tobogã, experimentando os extremos da euforia e da frustração em menos de 10 anos. No princípio, três projetos prometiam investir R$ 12,9 bilhões (em valores de hoje) no Estado, entre florestas e indústrias. Votorantim Celulose Papel (VCP) e Stora Enso recuaram. Quando tudo parecia perdido, a chilena CMPC apareceu no cenário, comprou a Aracruz, em Guaíba, a rebatizou de Celulose Riograndense e aplicará R$ 5 bilhões até 2015.
Isto significa menos da metade do anunciado pelas três gigantes papeleiras. Se um naco do investimento se perdeu, também murchou o medo do “deserto verde”, temor de ambientalistas.
O eucalipto moveu sonhos de riqueza. Há oito anos, o Estado foi loteado pelos três megaprojetos. A Metade Sul ficou com a VCP, depois Fibria. A Stora Enso fixou-se na Fronteira Oeste, enquanto a Aracruz pretendia crescer desde Guaíba. Juntas, somariam três fábricas e 300 mil hectares de florestas.
A perspectiva de transformar o Rio Grande do Sul num polo mundial de celulose gerou uma corrida. Houve produtores que venderam ou arrendaram as propriedades com a súbita valorização do hectare. Outros passaram a plantar eucalipto no lugar das lavouras de cereais ou de pastagens.
Mas ocorreu o inesperado. A crise mundial de 2008 e os obstáculos para a compra de áreas por empresas estrangeiras abateram os projetos como uma harvester — a enorme ceifadeira que corta e desbasta eucaliptos. A Votorantim foi a primeira a pular fora, virou Fibria (na fusão com Aracruz) e redirecionou os investimentos para Três Lagoas (MS).
Agricultor não colheu os 62 mil pés de eucalipto plantados em Cerrito
Havia dúvidas se a Stora Enso realmente cancelaria o empreendimento na Fronteira Oeste, onde mantém 23 mil hectares de eucalipto. Mas a empresa confirmou a desistência, por e-mail, pondo fim às especulações:
— Sim, o projeto de celulose no Rio Grande do Sul foi descontinuado.
A Stora Enso ficou só no Uruguai, onde as papeleiras estão sob as asas do governo, que inclusive se atrita com a vizinha Argentina por conta de reclamações sobre o impacto ambiental.
Produtor não pôde registrar fazenda em Quaraí
Soja compensou perdas no campo
O Brasil já é o quarto produtor internacional de celulose, com 13,97 milhões de toneladas no ano passado. A Associação Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa) informa que as fábricas se modernizaram. O que atrapalha, na visão empresarial, são as restrições para a aquisição de terras. Querem mudanças na lei para destravar projetos avaliados em R$ 67 bilhões no país.
Ao perder a Fibria e a Stora Enso, o Rio Grande do Sul herdou maciços florestais à espera da colheita. O presidente da Federação da Agricultura (Farsul), Carlos Sperotto, diz que os produtores ficaram inseguros. Só não há desalento e desvalorização de terras graças à soja. Para Sperotto, não pairam dúvidas sobre o que rende mais:
— A soja valoriza mais a terra do que o eucalipto. É uma concorrente desleal.
A Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetag) lamenta o que poderia ser qualificado de conto do eucalipto. O vice-presidente, Carlos Joel da Silva, diz que famílias venderam suas terras, incentivadas pela valorização repentina, ou descuidaram da produção de alimentos para cultivar árvores exóticas.
— A Fetag sempre alertou para a euforia demasiada. Propriedades de agricultura familiar acabaram nas mãos de grandes empresas — diz Joel.
Celulose Riograndense é o maior projeto do RS
Ao prometer o maior investimento privado já feito no Estado, de R$ 5 bilhões até 2015, a Celulose Riograndense compensa parcialmente as perdas dos projetos da Fibria e da Stora Enso. O presidente da empresa, Walter Lídio Nunes, garante que o cronograma das obras está em dia.
Com recursos da chilena CMPC, a Celulose Riograndense assumiu a planta da Aracruz, em Guaíba, com planos de ampliá-la e proporcionar entre 5 mil e 7 mil empregos. A produção de celulose deverá quadruplicar, alcançando 1,8 milhão de toneladas por ano.
A Celulose Riograndense poderia absorver os planos cancelados? Walter Lídio confirma que a empresa comprou os “direitos de superfície” da Fibria, na Metade Sul. No entanto, maiores investimentos na região dependem de mudanças na legislação sobre aquisição de terras.
Por enquanto, a CMPC não tem interesse no patrimônio da Stora Enso. Walter Lídio diz que um dos motivos é a posição geográfica. Mas acha que, se o governo federal resolver a questão das áreas, algum empreendedor internacional retomará o projeto.