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Absorventes femininos: entre liberdade, conforto e sustentabilidade

Por Elka Basile, executiva do setor de Celulose, Papel e Descartáveis Higiênico e sócia-Fundadora da Consultoria Puzzle Inovação e Soluções de Impacto

No Brasil, cerca de 54 milhões de mulheres em idade reprodutiva enfrentam um dilema ambiental significativo a cada mês. O absorvente feminino descartável, um produto amplamente utilizado e considerado símbolo de liberdade e conforto, traz consigo um impacto ambiental substancial devido à sua composição predominantemente plástica. 

A invenção do absorvente feminino descartável representou um avanço significativo na higiene íntima feminina. No passado, as mulheres recorriam a soluções menos seguras, como palhas de plantas e panos, que ofereciam menos conforto e mais riscos à saúde. O absorvente descartável trouxe uma melhoria notável em termos de praticidade e higiene, permitindo maior liberdade e conforto durante o período menstrual. 

Desde os tempos mais remotos, as mulheres buscaram soluções para lidar com esse processo natural. A invenção do absorvente feminino representou um marco na história da higiene feminina, proporcionando mais conforto, liberdade e segurança. No entanto, essa evolução, que acompanhou o empoderamento feminino e o crescimento populacional, também trouxe consigo desafios ambientais significativos. 

Portanto, a sustentabilidade desses produtos é uma questão crítica. O impacto ambiental é particularmente alarmante quando se considera a quantidade maciça de lixo gerada e a ausência de opções viáveis de reciclagem para esses produtos. 

O CICLO MENSTRUAL E EVOLUÇÃO DA SOCIEDADE 

Por milênios, as mulheres utilizaram diversos materiais como solução para a menstruação, desde gravetos de madeira envoltos de algodão ou pano, chumaços de lã, fibras de vegetais, rolinhos de grama. A partir da Idade Média, as mulheres passaram a usar toalhinhas laváveis e reutilizáveis. No início do século XIX, a menstruação foi considerada como doença (The Principles of Midwifery, Dr. John Burns, em 1811). 

A ideia de um produto descartável e mais higiênico começou a ganhar forma no final do século XIX. As primeiras ideias de absorventes surgiram em 1894, mas não foi dado importância para este produto, estes eram bastante rudimentares e não se popularizaram imediatamente. 

Em 1920 a Kimberly-Clark lançou o primeiro absorvente feminino comercializado nos EUA com a marca Kotex. O produto foi inspirado na ideia das enfermeiras da 1ª guerra com o material chamado Cellucotton** e adaptado para uso em período menstrual. 

Na década de 1930 o absorvente descartável ganhou destaque, por meio da marca Johnson & Johnson com seu produto Modess. Essa marca popularizou o uso do absorvente e, por muitos anos, o nome “Modess” tornou-se sinônimo de menstruação. 

EMPODERAMENTO FEMININO 

A criação do absorvente descartável, no início do século XX, revolucionou a vida das mulheres. Ao oferecer maior praticidade e higiene, esse produto contribuiu para o aumento da autoestima e da participação feminina em diversas áreas da sociedade. À medida que as mulheres conquistavam mais espaço no mercado de trabalho e em outros setores, a demanda por produtos como o absorvente feminino cresceu exponencialmente. 

CRESCIMENTO DO MERCADO INTERNACIONAL E COMPORTAMENTO DO MERCADO BRASILEIRO DE ABSORVENTE FEMININO 

O mercado global de produtos de higiene feminina foi avaliado em cerca de USD 41,21 bilhões em 2022, e espera-se que cresça a uma taxa composta de crescimento anual (CAGR) de 5,25% até 2031. Este crescimento é impulsionado pelo aumento da conscientização sobre a saúde menstrual, mudanças nos estilos de vida e a entrada de mais mulheres na força de trabalho. Produtos reutilizáveis, como coletores menstruais e calcinhas absorventes, estão se tornando populares devido à crescente consciência ambiental e à busca por alternativas que geram menos resíduos​ (Data Bridge Market Research, SkyQuest Tech Consulting). 

Historicamente o mercado de absorventes femininos no Brasil é dominado por produtos descartáveis, o mercado tem experimentado uma transformação significativa nos últimos anos. A crescente conscientização sobre os impactos ambientais e a busca por alternativas mais saudáveis e confortáveis impulsionaram o surgimento de uma variedade de produtos, como copos menstruais, calcinhas absorventes e absorventes de tecido laváveis e reutilizáveis. Essa diversidade de opções tem atendido a diferentes necessidades e preferências, democratizando o acesso à higiene menstrual e promovendo um debate mais aberto sobre o tema. 

Majoritariamente, o mercado brasileiro está focado em absorventes tipo externos. Dados levantados pela Nielsen em 2020 evidencia a seguinte distribuição no mercado: 

Volume (000 abs)  2020  % 
Absorvente Total  7.845.754  100% 
Abs. Externo – dia  3.790.932  48,3% 
Abs. Externo – Noite  1.386.757  17,7% 
Protetor Diário  2.264.271  28,9% 
Abs. Interno  276.007  3,5% 
Outros  127.787  1,6% 

 

Em 2022, o mercado de absorventes femininos no Brasil – e globalmente – continuou a mostrar crescimento, especialmente em segmentos sustentáveis, como coletores menstruais, calcinhas menstruais e absorventes laváveis. Embora os dados específicos do Brasil para 2022 não estejam amplamente disponíveis, a tendência geral aponta para um aumento significativo na demanda por produtos de higiene feminina sustentáveis. Estima-se que este mercado atualmente esteja respondendo por cerca de 8% do mercado total. 

O IMPACTO AMBIENTAL E A SUSTENTABILIDADE 

O lado obscuro dessa evolução se revela no impacto ambiental dos absorventes descartáveis. Compostos principalmente por plásticos, esses produtos levam anos para se decompor, contribuindo para a poluição dos oceanos e dos aterros sanitários. 

Segundo dados do IBGE, de 2022, a população feminina reprodutiva no Brasil, dos 15 aos 49 anos, representa um contingente considerável.  Esta população equivale a um total de 54.263.253 mulheres que menstruam todos os meses.  

O consumo médio de absorvente externo mensal por mulher é de 11,4 absorventes, equivalendo a 136,8 absorventes ano. Parte do absorvente é composto por celulose e a outra parte por polímeros (plásticos PE e PP). Aproximadamente 1,37g é plástico em cada unidade de absorvente. O que significa que uma única mulher gera cerca de 1,64 kg de plástico em absorventes por ano. Multiplicando esse valor pela população feminina reprodutiva, obtém-se um volume impressionante de resíduos plásticos. 

CONSUMO DE ABSORVENTES  15 a 49 anos  Uni 
Mulheres Reprodutiva              54.263.253   Mulheres 
Consumo Abs ano/mulher         7.423.213.010   abs/ano 
Descarte em Plástico              10.166.833   Kg/ano 

O consumo médio apresentado acima, representa um impacto ambiental brasileiro de 10.166.833 Kg de plástico por ano descartado no meio ambiente por não ter um processo pós uso para reciclar, reutilizar ou recuperar estes materiais, é extremamente perturbador. Por outro lado, é muito difícil para uma mulher contemporânea abdicar ao uso destes produtos. 

TENDÊNCIAS E EXPECTATIVAS DE CRESCIMENTO 

  • Absorventes externos: Historicamente, os absorventes externos sempre foram os mais populares no Brasil. No entanto, com o surgimento de novas opções e a crescente conscientização sobre questões como sustentabilidade e saúde íntima, sua participação de mercado pode estar em leve declínio. 
  • Absorventes internos: Os absorventes internos têm ganhado cada vez mais adeptos, principalmente entre as mulheres mais jovens. A facilidade de uso e a discrição são fatores que contribuem para o crescimento desse segmento. 
  • Copos coletores e calcinhas menstruais: Esses produtos, considerados mais sustentáveis e econômicos a longo prazo, estão crescendo em popularidade, embora ainda representem uma parcela menor do mercado. A expectativa é que sua participação continue aumentando nos próximos anos. 

PANORAMA 

A história dos absorventes femininos mostra como a sociedade e a tecnologia evoluíram, passando de soluções rudimentares para produtos inovadores e adaptados às necessidades das mulheres. No entanto, esses avanços trouxeram preocupações ambientais, principalmente devido ao uso de plásticos. Alternativas mais sustentáveis, como absorventes internos, copos coletores, calcinhas menstruais e absorventes laváveis, têm ganhado popularidade, mas cada uma apresenta seus desafios, como a necessidade de esterilização ou maior consumo de água. 

A sustentabilidade no setor de produtos menstruais é complexa, envolvendo a busca por soluções que equilibrem conforto, praticidade e menor impacto ambiental. Embora os absorventes descartáveis ofereçam praticidade, seu impacto ambiental ressalta a urgência de inovação e consciência ecológica. Refletir sobre o uso desses produtos e incentivar alternativas com menor impacto ambiental, é responsabilidade de todos, principalmente da indústria. Trazer inovação e desenvolvimento de materiais eco-friendly são papéis fundamentais para uma empresa que define tendências e preocupação com pessoas e planeta. 

Quem será ou serão as primeiras companhias do segmento ou novos entrantes que surpreenderão a população brasileira? 

**Cellucotton é um tipo de material absorvente desenvolvido pela Kimberly-Clark. Criado durante a Primeira Guerra Mundial, o Cellucotton é feito de celulose, derivada do algodão, e foi inicialmente utilizado para curativos e absorventes médicos devido à sua alta capacidade de absorver líquidos e fornecer um bom nível de higiene. 

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Elka Basile

Elka Basile possui sólida experiência no setor, com 28 anos de carreira dedicados às indústrias de Celulose, Papel e Descartáveis Higiênicos. Com atuação destinada a produtos de bens de consumo e insumos, Elka tem experiência em B2B e B2C em empresas nacionais e multinacionais, familiares e corporativas de pequeno a grande porte.
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