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Suzano Papel e Celulose: “A iniciativa privada também tem responsabilidade na crise”

Em entrevista à revista IstoÉ Dinheiro, o Presidente da Suzano desde 2013, Walter Schalka, faz reflexões e críticas sobre o presente e o futuro da indústria nacional e do País.

Walter Schalka, presidente da Suzano Papel e Celulose. Foto: Reprodução
Walter Schalka, presidente da Suzano Papel e Celulose. Foto: Reprodução

O executivo faz questão de ressaltar que ele e a empresa que comanda, cujo faturamento foi de R$ 10,2 bilhões em 2015, também precisam fazer parte da transformação do sistema. “Se não acabarmos com esse modelo em que todos acham que possuem mais direitos do que deveres com a sociedade, vamos quebrar o Brasil”, diz Schalka. Confira, a seguir, alguns trechos de sua entrevista:

Como o senhor avalia o governo Temer e as medidas tomadas até agora?
SCHALKA – O Brasil precisa de uma megarreforma. A principal delas é um megachoque de produtividade na economia brasileira para o País deixar apenas de ser um exportador de commodities. A inserção do Brasil na economia global é muito tênue. O País perdeu o bonde da tecnologia da informação – empresas como Google, Airbnb e Uber não têm espaço para serem criadas por aqui. Ainda vamos perder as duas próximas revoluções: da biotecnologia e da nanotecnologia. Estamos viciados em pensar em reformas pequenas, que chamo de reformas band-aids, que atacam os problemas pontualmente. Temos um desafio bastante profundo, que é a questão fiscal, mas não é o único. E nem ela, com a PEC de limitação de gastos, está sendo atacada da melhor forma.

O senhor acredita que há um preconceito da sociedade com a iniciativa privada?
SCHALKA – No Brasil ainda existe muito corporativismo em todos os setores e segmentos. Cada um defende os próprios interesses em detrimento dos objetivos comuns da sociedade. O setor privado não é diferente e precisamos quebrar esse ciclo. Vamos ter de abrir mão desses interesses. Então, se tiver que aumentar tributo para sair do atual momento, precisaremos pagar. Não podemos enxergar isso como negativo, mas como fundamental para esse processo de transição.

A indústria está cada vez mais perdendo espaço no PIB. Como o senhor enxerga esse momento?
SCHALKA – A indústria é um componente fundamental global e do Brasil. Essa percepção de perda de valor do PIB acontece em diversos países. Isso deve mudar assim que a indústria acordar e perceber que ela faz o produto para o consumidor final e que pode se aproximar dele, sem intermediação, e que pode ter uma enorme geração de valor. Entenderá que é possível usar a tecnologia para gerar uma disrupção e alterar o seu papel. O setor se acanhou ao longo da história e voltará a ter um espaço maior, não tenho dúvida.

Como o senhor está enxergando o atual momento do setor de papel e celulose?
SCHALKA – O setor está passando por uma transformação no mundo: diminuição na área de imprimir e escrever, por conta da digitalização, e crescimento de consumo nas áreas de tissue, como papel higiênico. Essa indústria, no Brasil, é ciclotímica. A volatilidade do câmbio, o qual não temos nenhum controle, e do preço da celulose, que está atualmente no pior patamar histórico, traz questionamentos sobre quais devem ser as modificações na indústria para aumentar o nível de rentabilidade. A Suzano optou por um caminho de melhorar processos e, consequentemente, a competitividade estrutural. Fizemos um programa de ataque a cada uma das etapas de produção buscando a redução dos custos e a alteração do modelo de negócios em um processo de diminuir os intermediários cada vez mais agressivos.

Planta da Suzano em Mucuri, na Bahia é alvo de investimentos em papel tissue.
Planta da Suzano em Mucuri, na Bahia é alvo de investimentos em papel tissue.

Na sua opinião, cortar intermediários é possível no segmento de celulose, que é tão distante do consumidor final?
SCHALKA – A indústria de celulose tem um problema muito sério no Brasil. Produzimos celulose por aqui, mandamos para a China, que faz o papel e envia o produto para o resto do mundo. A pergunta é a seguinte: qual é a lógica estratégica de não agregar valor à celulose? A primeira reação é dizer que a mão de obra na China é mais barata, mas na conversão para o papel não é necessário tanta gente. Depois falam dos impostos, só que os impostos para exportação no Brasil são zero. Por último, afirmam que o custo de capital chinês é menor. O que é verdade, mas é algo marginal. O da Suzano é 4,4%, enquanto o chinês é 3,2%. Tem diferença, porém não é algo tão significativo a ponto de justificar a falta de produção de papel no Brasil. Ou seja, deveríamos ser produtores de papel de maneira muito mais competitiva, assim como somos de celulose. Até por isso, fizemos investimentos de R$ 400 milhões em Mucuri e Imperatriz para ampliar a produção de papel tissue. Ao mesmo tempo, existe o projeto da árvore do futuro, que crescerá mais rápido e será mais resistente às pragas. O Brasil é o País mais competitivo do mundo em florestal, mas tem potencial para muito mais.

Como o senhor disse, o setor é muito refém de duas variáveis: preço da celulose e o câmbio. O que fazer para se tornar mais resistente?
SCHALKA – É necessário um redesenho da indústria. É frustrante você fazer um trabalho de evolução constante e ver seus dados financeiros instáveis por conta de fatores que não se pode controlar. A indústria precisará passar por uma transformação relevante. Pode ser por consolidação ou verticalização, que leve a uma criação de valor mais sustentável.

Tanto a Suzano quanto as suas principais concorrentes no Brasil e no mundo aumentaram as capacidades de produção. Não há muita oferta no mercado?
SCHALKA – O grande problema para a criação de valor foi o excesso de capacidade. Esse fator, somado ao crescimento da demanda internacional menor do que o esperado, vem gerando essa sobreoferta. A queda de preços é por conta disso. Como as empresas vêm operando abaixo do seu custo médio de capital na exportação de celulose, na prática estamos exportando capital. Não vejo isso como positivo para a indústria brasileira e nem para o Brasil.

Então, vocês não planejam aumentar a capacidade da empresa no curto prazo?
SCHALKA – Existe uma tendência da indústria de trabalhar em plena capacidade e temos floresta sobrando. Na teoria, seríamos os próximos a anunciar o aumento de produção, mas no curto prazo temos outras prioridades. Ficou provado, ao longo do tempo, que esses mega-investimentos em fábricas não vêm trazendo retorno adequado aos investidores. As unidades fabris geram caixa, mas também um grande problema de percepção. Uma coisa é gerar caixa, outra é gerar retorno sobre o capital empregado. São coisas completamente distintas. O crescimento não é a única maneira de criar valor para o nosso investidor.

A consolidação poderia mudar isso? É algo que a Suzano vem observando com atenção?
SCHALKA – É impossível olhar os números e não enxergar que há uma supercriação de valor na consolidação do mercado sul-americano e não apenas no brasileiro. Mas não há conversas por enquanto.

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