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A necessidade de descomoditizar o tissue

Por Dineo Silverio, CEO da ConnectTissue

Recentemente, estava dirigindo por uma região pouco habitada e vi um outdoor de propaganda de um posto de gasolina com a seguinte frase: “Temos banheiro limpo!”

Me chamou muita atenção aquele anúncio por diversas razões. O outdoor era enorme, iluminado e com uma imagem muito bem realizada, ou seja, houve um investimento acima do normal para aquele anúncio e, principalmente, trazia aquela mensagem que portava um atributo do negócio que aquele empresário queria comunicar. Fiquei pensando e fazendo analogia ao setor que atuamos.

Primeiramente, “ter um banheiro limpo” deveria ser um atributo básico, não é mesmo? Mas sabemos que pelas estradas do Brasil isso nem sempre é verdade, e, portanto, para uma grande maioria do público que passa pelas estradas, ter um banheiro limpo pode ser sim um atributo de decisão para parar o carro em um posto de gasolina e abastecer, usar o banheiro e ir à loja de conveniência, gerando assim o consumo esperado pelo empresário que anunciou. Então, a primeira analogia que fiz é: estamos sabendo comunicar ao nosso cliente os atributos de nosso produto, os básicos e os inovadores, que, sim, são básicos por vezes, mas que precisam ser ditos aos nossos clientes finais e aos compradores de supermercados?

Posteriormente, fiquei pensando no investimento feito naquele outdoor versus a mensagem certeira que aquele empresário dono do posto gostaria de passar. Ele investiu naquela propaganda, e tenho certeza de que ele pensou sobre a mensagem que queria passar aos clientes antes mesmo de colocá-la ali. Então, vem a segunda analogia: com que frequência nós pensamos a respeito da mensagem que queremos transmitir aos nossos clientes quando vamos apresentar nossos produtos tissue? Como estamos investindo nos nossos vendedores, que são os nossos outdoors da nossa empresa? Nossas empresas fabricantes de tissue desenvolvem produtos cada vez mais sofisticados, uma vez que os produtores de tecnologia de papel e conversão se empenham em desenvolver sempre melhores inovações, mas será que estamos conseguindo transmitir ao cliente final tudo isso que estamos desenvolvendo e incorporando em nossos produtos?

Na realidade, o que vemos é uma necessidade já antiga de “descomoditizar” o tissue no Brasil, pelo próprio bem das empresas que atuam nesse mercado, uma vez que vemos o aumento da concorrência e a queda das margens de contribuição dos negócios.

Como comentei, os produtores de tecnologias, de máquinas e de insumos se aplicam continuamente em desenvolver novas soluções que agregam valor ao produto tissue, que, muitas vezes, são incorporadas pelos produtores ao seu portfólio por meio da criação de novos produtos. Porém, sentimos que muitas vezes esses mesmos produtores de tissue não conseguem expressar ou rentabilizar todo esse desenvolvimento realizado no produto da forma mais eficaz, e fazer com que isso se transforme em forma de valor agregado na venda, trazendo vantagens para aquele produtor de tissue que decidiu inovar.

Minha percepção sobre essa dificuldade de levar adiante os atributos de produto que diferenciam um produto do outro, impossibilitando assim a criação de valor no próprio produto, é que existem algumas razões para isso, e tentarei elencar três delas aqui.

  1. Saber comunicar corretamente os atributos do produto ao cliente final, o consumidor: estudos de desenvolvimento de produtos, inovações bem estudadas e realizadas, campanhas de marketing a fim de atingir o público consumidor da melhor maneira possível. Essas ações irão ajudar o produtor de tissue a se diferenciar dos demais e, com isso, buscar a atenção do consumidor final, fazendo com que seu produto seja desejado na gôndola, aumentando assim seu giro no estoque do mercado e, dessa forma, saindo um pouco da pressão de preço existente nas negociações. Parece básico, mas muitos produtores se esquecem disso, e não pensam nas estratégias de como atingir seu consumidor final. Comunicar “o banheiro limpo” por vezes é tão eficaz e funciona tão bem como realizar uma grande campanha. O importante é encontrar o atributo correto e que chame a atenção do cliente para o seu produto, e trabalhar sobre isso da melhor maneira possível.
  2. Pressão de quem compra: quem compra quer comprar pelo preço mais barato sempre. Soma-se a isso o fato de que os supermercados têm se tornado cada vez mais fortes nesse equilíbrio de forças, pois as grandes cadeias impõem suas condições e, se aquele produtor não aceitar, tem outro que aceita. Além disso, os médios e pequenos supermercados têm se unido em cooperativas de compras para igualmente utilizarem dessas estratégias. Sendo assim, o produtor de tissue que quiser diminuir sua dependência desse ambiente necessita pulverizar seu volume produtivo em mais e mais clientes, utilizando assim uma estratégia comercial pautada em uma carteira de clientes ampla e diversificada em volume e em estratégias de vendas. Sabemos que, de certa forma, isso é mais custoso e oneroso em tempo de formatação e em estrutura comercial, mas acredito que é uma das saídas para diminuir o impacto dessa dependência e será uma forma de fortalecer a empresa em situações adversas.
  3. Treinar força de vendas sobre os atributos do seu produto: sabemos que, muitas vezes, durante a negociação de produtos tissue, as negociações são pautadas basicamente sobre volume, mix de produto, condições de entrega, e outros itens mais que não estão diretamente ligadas ao produto em si. Isso faz com que toda a inovação desenvolvida pelo produtor de tissue se coloque em segundo plano, não trazendo valor agregado esperado para a empresa que inovou. Acredito que uma equipe de vendas com conhecimento do produto que vende (conhecendo atributos como bulk, maciez, resistencia, absorção, hand-feel e muitos outros) pode sim, em momento oportuno, utilizar desse conhecimento e formular argumentos de vendas que possibilitem a esse profissional de vendas mostrar as diferenças que o produto dele possui em relação à sua concorrência. E por que isso não ocorre? Porque, na minha opinião, muitas vezes, esses profissionais não têm o conhecimento necessário ou suficiente para realizar esse nível de argumentação e, sendo assim, evitam entrar nessa discussão quando têm oportunidade, levando a conversa mais para um efeito “toma lá da cá”, que, por sinal, o comprador do outro lado da mesa adora entrar, desperdiçando assim a oportunidade de criar valor para aquela inovação de portfólio realizada pelo produtor. Recentemente, participei de uma convenção de vendas de um grande produtor de tissue, na qual explanei sobre esses atributos de produto e fiquei impressionado com a necessidade de incrementar o conhecimento dos produtos existentes naquele portfólio para aquela equipe de vendas.

Descomoditizar o tissue é urgente e necessário para a sobrevivência de um setor que tenha capacidade de continuar crescendo e gerando riqueza aos seus players, e sabemos que a inovação é um dos melhores caminhos para isso.

Porém, o assunto é amplo e complexo e é necessário um olhar atento sobre ele. É necessário inovar para se ter uma diferenciação no produto e criar um valor agregado, e isso é muito claro para todos. Mas a inovação sem um acompanhamento correto da forma como ela será divulgada, apresentada e inserida nessa cadeia, perde seu valor principalmente se não for adequadamente comunicada ao mercado e a força de venda que vai expor esse produto. Tenho certeza de que a somatória de inovação, comunicação estruturada e equipes comerciais bem treinadas no conhecimento do produto, com a experiência comercial que possuem, pode fazer a diferença em um mercado tão competitivo como o que estamos vivenciando.

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Dineo Silverio

Dineo Silverio é CEO da ConnectTissue, empresa especializada em serviços de consultoria dedicados à conversão de tissue, VP de Business Strategy & Development do Grupo PHS do Brasil, e membro de Conselhos Diretivos e Estratégicos de empresas do setor. Possui ampla experiência e vivência na área de conversão, com mais de 28 anos dedicados a tissue. Atuou como presidente da Körber Tissue durante cinco anos, onde conheceu profundamente os processos produtivos dos equipamentos e complexidade do setor. Previamente, atuou por 16 anos na área comercial de venda de linhas e equipamentos de conversão de rolos e dobrados como diretor comercial e executivo de vendas, com mais de 200 linhas de conversão e projetos realizados e negociados com clientes do Brasil e América Latina, criando uma ampla rede de relacionamentos sólidos com clientes e fornecedores. Atuou, ainda, como assistente técnico, tendo instalado 27 linhas de conversão e inúmeros outros projetos de melhorias e adaptações de máquinas em toda a América Latina e Brasil, onde tomou conhecimento profundo do processo produtivo de tissue na prática.

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